27 de Abril de 2021 - 14h:39

Tamanho do texto A - A+

Em decisão inédita, Justiça blinda patrimônio de igreja na crise da Universidade Metodista

Justiça do RS determinou que entidade religiosa não seja afetada pelo processo prévio de recuperação judicial do grupo educacional

Por: O Globo

A Justiça do Rio Grande do Sul decidiu blindar o patrimônio da Igreja Metodista na ação em que o Grupo Educação Metodista, dono de 17 instituições de ensino no país, pede proteção contra credores num processo prévio à recuperação judicial. A decisão é inédita em processos de insolvência.

 

A sentença foi proferida pelo juiz Gilberto Schafer, da Vara de Direito Empresarial de Porto Alegre, no dia 22 de abril. Com ela, o magistrado deu a dez associações ligadas à Igreja Metodista o benefício de suspender qualquer execução de dívida, algo geralmente só concedido a empresas privadas em dificuldades financeiras. 

 

O juiz do caso acatou a um pedido do grupo educacional, que alegou no processo ser imprescindível proteger o patrimônio da Igreja Metodista, sua mantenedora, para evitar a falência de suas atividades empresariais no ramo da educação.  

 

Apesar de ter suas principais atividades operacionais em São Paulo, o Grupo Educação Metodista pediu proteção na Justiça gaúcha por meio de um mecanismo chamado “cautelar antecedente”, que funciona como uma espécie de processo prévio à recuperação judicial. O pedido foi feito no dia 9 de abril. 

 

Na esteira do Fies

 

As principais instituições do grupo são a Universidade Metodista de São Paulo e a Universidade Metodista de Piracicaba. O passivo das 17 empresas educacionais é de aproximadamente R$ 500 milhões, a maior parte formadas por dívidas trabalhistas. 

 

Desde 2017, segundo Aser Gonçalves Junior, diretor de operações estratégicas da empresa, a perda de alunos foi de 60%. A crise se deu após mudanças no Fies, programa governamental de financiamento de ensino superior privado que foi desidratado a partir do final do governo Dilma Rousseff.

 

A pandemia e a concorrência por alunos com grandes conglomerados de educação aceleraram a perda de receita, de acordo com o executivo, que confia na recuperação do grupo. 

 

“O problema de liquidez (das igrejas) decorre das penhoras de valores feitas pela Justiça do trabalho. O plano de soerguimento das Instituições de Ensino pressupõe que os recursos financeiros da Igreja Metodista não sejam penhorados para que possam ser alocados às próprias atividades das Igrejas e às Instituições de Ensino de modo organizado”, escreveu o juíz Schafer em sua decisão, citando o argumento das empresas. 

 

– A igreja não está em recuperação judicial propriamente dita, mas (com essa decisão) ela participa da recuperação – afirma Luiz Roberto Ayoub, sócio do escritório Galdino & Coelho, que representa as igrejas na ação.

 

Ele continua:

 

- O juiz já havia deferido o pedido (de cautelar antecedente) para as instituições de ensino, mas elas não podem se recuperar se o patrimônio da igreja está o tempo todo sendo comprometido por sentenças condenatórias na Justiça do Trabalho.

 

Tese controversa 

 

A tese é controversa no meio jurídico, uma vez que a lei de falências não prevê literalmente a recuperação judicial de associações ou instituições religiosas, de acordo com Ronaldo Vasconcelos, sócio do escritório VH e professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie. 

 

– Além disso, igrejas e associações já têm benefícios legais que as diferenciam de empresas privadas. Elas não pagam impostos, por exemplo – afirma o advogado. 

 

Ayoub, no entanto, diz que o grupo Metodista deve ser considerado um agente econômico de fato e que a blindagem do patrimônio da igreja mantenedora é indispensável para viabilizar qualquer recuperação judicial das instituições de ensino. 

 

– Neste caso, as associações de ensino da Metodista vão entrar em recuperação judicial. Elas têm uma roupagem de associações, mas substancialmente são empresas, produzem uma atividade econômica, que é a educação. A forma é o de menos – afirma o advogado.

 

E questiona:

 

– Não estamos querendo proteger as associações que gozam de benefícios (fiscais), mas sim agentes econômicos que fazem girar a roda da economia, geram empregos, oferecem bolsas de estudo. Além disso, quantas empresas privadas têm também, por interesses da economia brasileira, isenções fiscais e podem entrar em recuperação judicial? 

 

Segundo o representante da Metodista, o grupo educacional deve formalizar nesta semana seu pedido de recuperação judicial.  

 

Se o juiz acatar a solicitação, a empresa deverá formular um plano para pagar suas dívidas. A Metodista pretende vender ativos para amortizar seu passivo. 

 

 

 

 
 
VOLTAR IMPRIMIR