31 de Maio de 2007 - 15h:11

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Mais uma mordida da Receita, agora nos investidores

Por: Valor Econômico

Amanhã, os investidores verão mais de R$ 3 bilhões desaparecerem de fundos de renda fixa, DI, curto prazo e multimercados. Trata-se da cobrança semestral do imposto de renda sobre a rentabilidade das carteiras, conhecida como come-cotas, que ocorre em maio e novembro. Serão subtraídos valores equivalentes a 15% ou 20% do ganho apurado pelas carteira desde novembro ou da data do aporte nos fundos, o que ocorreu depois. Com o recolhimento obrigatório do imposto amanhã, o investidor desses fundos pode aproveitar para reavaliar suas aplicações e verificar a vantagem de migrar para novas aplicações, pois já pagou o tributo. Isso vale para quem já atingiu a alíquota mínima de imposto, após dois anos.

O come-cotas era mensal e, desde 2005, passou a reduzir semestralmente o potencial de ganho dos fundos. Por ele, a Receita antecipa receitas referentes ao imposto de renda. Já o investidor perde a rentabilidade que obteria sobre esses recursos, que são destinados antecipadamente ao governo. No curto prazo, essa diferença é pouco perceptível, mas cresce quanto maior a duração da aplicação. O come-cotas não incide sobre fundos com mais de dois terços da carteira aplicada em renda variável .

Para driblar o come-cotas, o investidor pode optar por títulos do Tesouro Direto, cujo pagamento do imposto ocorre apenas no vencimento do papel ou na venda do título. Nos últimos meses, o Tesouro Nacional tem vendido títulos com vencimento cada vez mais distante. Na quinta-feira, ofereceu Notas do Tesouro Nacional série B (NTN-B, que seguem o IPCA) com vencimento em 2017. Nesses dez anos, por exemplo, o come-cotas poderia reduzir o rendimento do investidor em um ponto percentual. Essa seria a perda potencial de um fundo em relação ao Tesouro Direto, se o desempenho de ambos fosse idêntico. No caso de uma NTN-B com vencimento em 2045, a vantagem do papel sem come-cotas seria ainda maior.

O mesmo conceito do Tesouro Direto vale para CDBs e papéis de securitização, embora nesses casos seja mais difícil encontrar vencimentos tão distantes, que tornem significativa a vantagem dos investidores com relação ao come-cotas.

Ao adquirir um papel privado, porém, o investidor estará sujeito a uma volatilidade maior porque não seria tão fácil diversificar a carteira com vários papéis, como ocorre em um fundo de investimento, diz Gilberto Braga, professor de Finanças do Ibmec-Rio e conselheiro fiscal da Associação Nacional dos Bancos de Investimento (Anbid). Além disso, o risco da aplicação seria concentrado em menos papéis ou emissores no caso de um papel privado.

O investidor poderia comprar diretamente papéis do Tesouro Direto ou CDBs, por exemplo, mas aí teria de ter conhecimento e acompanhar os mercados financeiros para saber o desempenho da aplicação, diz Braga. "A cota do fundo mostra o que está acontecendo diariamente com as aplicações, mas comprando os papéis diretamente não se tem a real idéia de quanto eles valem em determinado momento."

A estratégia mais indicada para quem não é profissional é ficar em fundos, mas olhar com cuidado quem é o gestor, comparando taxas de administração e desempenho, por exemplo. Elas hoje fazem mais diferença do que o come-cotas no fim das contas, diz Braga. "O come-cotas é um mal para os fundos, mas todos os gestores cumprem a regra igualmente", explica.

Outra alternativa para o investidor livrar-se do come-cotas em aplicações de longo prazo seria optar pelos planos de previdência, caso do Vida Gerador de Benefícios Livres (VGBL). Sobre o plano de previdência privada, o IR incide apenas nos resgates, lembra Raphael Santoro, consultor de investimentos da Towers Perrin . Mas é preciso estar atento à taxa de administração cobrada no VGBL - que, em geral, é maior do que a dos fundos e pode suprimir essa vantagem da isenção do come-cotas -, assim como à eficiência na gestão dos recursos pela instituição, diz ele.

O consultor da Towers Perrin lembra ainda que, do ponto de vista tributário, o VGBL apresenta outra vantagem. Pela tabela de alíquotas regressivas de imposto de renda. o investidor que permanecer por mais de dez anos com o patrimônio investido no VGBL poderá pagar apenas 10% de IR sobre o lucro obtido.

Braga, do Ibmec-Rio, lembra que, até o início de 2005, além de mensal, o come-cotas tinha alíquota única de 20% e consumia parcela ainda maior da rentabilidade dos investidores. "Se o dinheiro que vai para o come-cotas ficasse no condomínio, ele continuaria rendendo." Hoje, a alíquota - exceto para os fundos de curto prazo - é de 15%, a menor entre as previstas para aplicações em fundos. "Mas se você resgatar o dinheiro antes de um ano, onde incide a alíquota de 20%, terá de pagar a diferença de imposto, de 5%, em relação aos 15% que foram pagos no come-cotas", explica Braga, especialista em planejamento tributário do Ibmec-Rio.

Ele admite que esse cenário hoje seja melhor do que o que existia há dois anos, mas ainda é ruim. "Na prática o aplicador antecipa uma tributação sobre um rendimento que ainda não levou para casa."

O site Fortuna chegou à projeção de recolhimento de mais de R$ 3 bilhões pela Receita referentes ao come-cotas amanhã com base na rentabilidade de R$ 40 bilhões obtida de novembro para cá pelos fundos de investimento sujeitos a essa cobrança. Mais da metade desse rendimento, ou cerca de R$ 20 bilhões, refere-se a investimentos de pessoas físicas, que devem pagar o imposto - investidores institucionais e empresas tributadas pelo lucro presumido não estão sujeitas ao come-cotas. Assim, o Fortuna estimou a alíquota de 15% sobre a parcela de rendimentos do varejo, em torno de R$ 20 bilhões, o que chegaria aos R$ 3 bilhões. A projeção é conservadora, pois a parcela do rendimento do varejo deve superar os R$ 20 bilhões. A Receita Federal não tem uma projeção sobre o recolhimento.
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