02 de Fevereiro de 2007 - 16h:12

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Supremo deve estrear súmula vinculante em decisão sobre INSS

O Supremo Tribunal Federal (STF) deverá promover a estréia da súmula vinculante no julgamento de um rombo bilionário nas contas da Previdência, na próxima quinta-feira.

Por: Valor Econômico

Numa única tacada, os ministros irão resolver milhares de processos em que pensionistas pedem o direito a receber 100% do que era pago aos segurados do INSS. Esses processos tramitam há mais de dez anos na Justiça e, agora, se o INSS perder, o Tesouro terá de pagar de imediato R$ 7,8 bilhões apenas para as pensões concedidas antes de 1995. Nos próximos 20 anos, o rombo pode chegar a R$ 40 bilhões. E, caso essa tese de pagamento de pensões integrais for estendida para outros benefícios, como auxílio-doença, auxílio-acidente, aposentadoria por invalidez, por idade e por tempo de serviço, o rombo saltaria para R$ 120 bilhões, segundo informações do processo no STF.

A súmula vinculante - instrumento que obriga todos os juízes e o poder público a seguir as decisões do STF - foi aprovada pelo Congresso no final do ano passado e o tribunal deverá indicar este caso, que é conhecido como o "esqueleto das pensões por morte", para inaugurá-la.

O vice-presidente do STF, ministro Gilmar Mendes, explicou ao Valor que existem alguns projetos de súmula prontos, como o problema do aumento na base de cálculo da Cofins (que afeta diretamente às empresas) e a correção das contas vinculadas ao FGTS (um caso de interesse dos trabalhadores). Mas, o rombo da pensão por morte será o primeiro caso de grande repercussão em que a súmula deverá ser aplicada já que envolve, segundo o ministro, uma "infinidade de casos". Existem sete mil processos sobre este assunto apenas no STF e alguns ministros estão com os seus gabinetes lotados por causa do excesso de ações sobre este problema.

A expectativa é que o governo se livre do rombo. Dos onze ministros do STF, cinco já votaram. Destes, quatro (Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia Antunes Rocha, Joaquim Barbosa e Gilmar Mendes) concluíram que o governo não deve corrigir as pensões em valores que chegam a 100% do que recebia o morto. Eles entenderam que deve ser mantido um equilíbrio atuarial e financeiro na Previdência, de modo a viabilizar o pagamento a todos os beneficiários, sem excessos que comprometam o sistema. Apenas o ministro Eros Grau foi contrário à tese do governo. O caso foi suspenso por pedido de vista do ministro Carlos Ayres Britto, em 31 de agosto do ano passado, e deverá ser retomado na próxima quinta-feira.

Será a primeira grande questão de massa a ser decidida pelo STF desde que o tribunal começou a preparar os enunciados de súmula vinculante. O incômodo com o excesso de processos repetitivos sobre "pensão por morte" é tão grande no STF que o ministro Marco Aurélio Mello chegou a fazer um apelo a Carlos Britto para que ele recolocasse o processo em pauta num "tempo curto".

Caso a expectativa de vitória do governo se confirme, a Previdência conseguirá apagar uma dívida potencial de bilhões de reais de seus cofres, sem a necessidade de mandar um novo projeto de lei, ou de emenda constitucional ao Congresso. Com isso, o presidente Lula e o ministro da Previdência, Nelson Machado, ganharão um forte argumento à tese de que não é preciso fazer uma nova reforma na Previdência para reduzir o seu déficit, mas apenas atuar na gestão de suas contas.

O "esqueleto" surgiu por causa de uma lei aprovada pelo Congresso em 1995. Até aquele ano, os pensionistas recebiam 80% do salário dos segurados, acrescido de 10% por dependente até o limite de dois dependentes. A Lei 9.032- aprovada em abril de 1995 para elevar o salário mínimo, na época, para R$ 100,00 - mudou essa regra: fixou as pensões em 100% do valor do salário do segurado. Dessa forma, os pensionistas passaram a receber exatamente o mesmo valor que o segurado recebia.

O "esqueleto da pensão por morte" é, segundo Gilmar Mendes, uma causa interminável. Pela lei, os pensionistas têm até cinco anos para entrar com pedido na Justiça para receber 100% do valor que era pago ao morto. Porém, muitos juízes passaram a conceder os 100% para antes de 1995, sob a alegação de que não estão retroagindo o benefício para antes daquele ano, mas dando a sua "aplicação imediata" no tempo. Com isso, as ações a rigor não prescrevem. Os pensionistas podem pedir a qualquer tempo na Justiça o direito a receber 100% do valor que era pago ao morto. "Sempre haverá os retardatários, aquelas pessoas que demoraram a entrar na Justiça, e, se não tomarmos uma decisão definitiva neste assunto, sempre teremos que julgar estes processos", afirmou Mendes.

O governo passou a considerar o caso como um "rombo" nas contas da Previdência em maio de 2004, quando a Turma de Uniformização dos Juizados Especiais Federais, em Brasília, editou súmula consolidando um entendimento contrário à União. Essa súmula fez com que todos os processos em que pensionistas pediam o benefício de 100% do valor recebido pelo morto nos Juizados Especiais corressem mais rapidamente.

Estes processos eram julgados sem recursos e com decisões praticamente imediatas. Dessa forma, muitos pensionistas recorreram aos Juizados - órgãos julgam questões de até 60 salários-mínimos. Eram ações pequenas, se consideradas individualmente. Mas, no conjunto, resultaram em grandes valores para a União. Gilmar Mendes concedeu uma medida cautelar para suspender estes processos de Juizados. Segundo ele, estes processos ficarão paralisados até a decisão final do Supremo.

Durante a sessão de abertura do Ano Judiciário, realizada ontem, a presidente do STF, ministra Ellen Gracie, defendeu a importância da súmula vinculante. "A edição de súmulas com força vinculante para a administração irá permitir que seja desinflada a demanda que hoje recai sobre a Justiça Federal e as Varas de Fazenda Pública, de maneira particularmente sensível", disse Ellen. A ministra enfatizou que, com a súmula, "todas as causas de massa, que tenham por núcleo uma mesma questão de direito, ficarão definidas se já ajuizadas ou serão mesmo estancadas no nascedouro".
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