04 de Agosto de 2008 - 15h:31

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Empresas priorizam acordos para reduzir passivos em seus balanços

Por: Valor Online

A cada dez meses, a carteira de processos judiciais ou administrativos propostos aos milhares diariamente por consumidores dobra de tamanho se as empresas nada fizerem. A estatística não é exatamente a mesma para todas as companhias, mas dá uma mostra do porquê as companhias começaram a se preocupar em reduzir seus passivos e conseqüentemente os valores de suas provisões em balanços. A tática que tem sido mais usada é a criação de políticas de acordo para não só reduzir o número de processos como preveni-los. O resultado é que advogados constatam que mesmo com o grande crescimento do consumo nos últimos anos, o número de processos não cresce na mesma proporção.

Esta é uma realidade que começa a ser retratada no dia-a-dia dos escritórios de advocacia especializados em contencioso de massa, que fazem a gerência da imensidão de processos de pequenos valores originados das relações de consumo. Um cliente do escritório Fragata e Antunes, por exemplo, estabeleceu neste mês uma política de acordo para reduzir seu passivo em 25% nos próximos três meses. "Temos no escritório o que chamamos de uma célula de acordo, há seis anos, e a quantidade de clientes que usa hoje o grupo que compõe essa célula aumentou muito", diz Francisco Fragata Junior, sócio do escritório que administra o contencioso de importantes empresas como a C&A, a rede nordestina Insinuante, Credicard, entre outros.

A estatística apresentada no começa desta reportagem foi feita pelo advogado Solano de Camargo, do escritório Dantas, Lee, Brock & Camargo, em um parecer elaborado para um cliente. O mesmo estudo mostra que se o processo é levado até o fim e a empresa perde, os gastos podem ser 16 vezes maiores levando em consideração os custos administrativos, o valor da condenação, as eventuais multas aplicadas pelo Procon. Até mesmo quando a empresa tem razão, o custo para levar um processo adiante pode ser maior, dependendo do valor do produto, afirma Camargo. Um processo levado até o fim num juizado especial tem um custo 60% maior para a empresa.

Mas ao deixar de enfrentar uma ação na Justiça, da qual a empresa acredita ter inquestionável razão, para priorizar acordos, a companhia pode incorrer no risco do que Camargo chama de "efeito paradoxo". Este é o efeito que a notícia do acordo, que pode ser espalhada boca-a-boca, pode ter sobre outros consumidores que passam a se sentir estimulados a acionar a empresa e, com isso, inflar os números.

Uma das formas de evitar esse efeito paradoxo é manter o completo sigilo das políticas de acordos fixadas pelas empresas, como sugere o coordenador de contencioso cível de escala do escritório Siqueira Castro, Gustavo Gonçalves Gomes. "As grandes empresas começaram a mudar suas políticas para evitar processos e começaram a estimular acordos", diz Gomes. "Mas precisam manter o sigilo dessas políticas".

O Siqueira Castro administra hoje 50 mil processos de suas clientes e o advogado Gomes notou que o uso frequente de acordos pelas empresas fez com que o número de processos não crescesse na mesma proporção que o volume do consumo. O advogado lembra que as empresas não querem encabeçar as listas do Judiciário de campeãs de processo. "Fazer acordo e evitar o Judiciário é também muito bom para a imagem da empresa", diz Gomes. A advogada Catarina Costa do escritório Danneman Siemsen, especializado em propriedade intelectual, mas que entrou no filão do contencioso de massa há dois anos, diz ainda que muitas empresas usam política de acordos para manter o consumidor como cliente. Camargo, do escritório Dantas, Lee, Brock & Camargo, diz que uma enquete com consumidores mostra que pelo menos 40% quer apenas trocar o produto e não receber o dinheiro de volta, o que demonstra a confiança deles nas empresas.

Josette Goulart, De São Paulo

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