01 de Agosto de 2008 - 14h:46

Tamanho do texto A - A+

Executivos estão preparados para compartilhar o risco?

Euforia e os fracassos das empresas pontocom, que utilizaram este sistema em larga escala, têm pelo menos o mérito de obrigar todos os envolvidos nestes processos

Por: Valor Online

A pressa como alguns modismos ou tendências são implantados em empresas no Brasil leva-os à fracassos que depois dificultam sua aceitação. É o que vem ocorrendo com as políticas de oferecer à empregados participação acionária nas empresas onde trabalham. A maioria das análises sobre o tema, bem como as formas de implementação são conduzidas, exclusivamente, dentro de uma política de remuneração do trabalho. Ou seja, privilegiam o velho conceito de procurar envolver os executivos com um aumento da sua remuneração variável que o vincule aos resultados da empresa. Supondo também que desta forma se ampliam os vínculos com a organização gerando uma lealdade mais duradoura. Razão pela qual esta prática recebe a irônica qualificação de "algemas de ouro."

A euforia e os fracassos das empresas pontocom, que utilizaram este sistema em larga escala, têm pelo menos o mérito de obrigar todos os envolvidos nestes processos à repensá-lo com relação ao seu futuro.

Analisando do ponto de vista dos novos modelos empresariais - e é evidente que o Brasil é parte importante- o conceito relativo à proporcionar aos empregados a oportunidade de participar dos riscos - ganhos ou perdas - das empresas é interessante e útil. Mas também se torna imperioso considerar que sua aceitação- e compreensão- pressupõe revisar o próprio sistema de ensino de administração de nossas instituições educacionais.

Os programas que preparam nossos administradores ainda estão baseados no conceito tradicional do trabalho e capital. Ou seja, nossas escolas são brilhantes instituições que preparam empregados que vão ao mercado oferecer suas competências à empreendedores e empresários que investem seu capital nos negócios que eles acreditam e assumem o risco.

Tornar alguém sócio, acionista ou partícipe do processo de risco do capital exige muito mais preparo do que hoje é oferecido pelas escolas de administração. Na realidade poderíamos dizer até que vai ser necessário mudar a "cultura" e mentalidade brasileira no que se refere ao vínculo empregado-empresa.

Vale recordar que o conceito e prática das "stock options" origina-se em uma cultura baseada na livre iniciativa e onde falar sobre capitalismo empresarial não soa como algo tão explorador como no Brasil. O jovem norte-americano nasce mergulhado numa sociedade que reconhece a riqueza como algo que pode ser conquistado e compartilhado sem nenhum sentimento de culpa. O que, evidentemente, não significa que isto possa ser bom ou mau. Mas é uma realidade cultural que facilita a aceitação do conceito de risco embutido numa prática como a de distribuir participação aos funcionários.

As mudanças que estão ocorrendo no capitalismo empresarial brasileiro estão sendo muito rápidas. Não podemos esquecer que nossa riqueza veio da capacidade de trabalho dos empreendedores das diferentes fases do nosso desenvolvimento. E tanto os hoje www.interjornal.com.br asn.interjornal.com.br "capitalistas" precisam estar dispostos à dividir seus riscos e resultados como as pessoas educadas para serem assalariadas necessitam compreender que associar-se não significa participar apenas dos benefícios.

Tornar-se sócio de algum empreendimento exige preparo para participar das decisões de risco. Envolver-se nas questões estratégicas não apenas do negócio em si, mas especialmente do capital. Manter-se informado sobre o mercado, desempenho dos negócios, compreensão do universo financeiro, relação custo-benefício e tantos outros conhecimentos para que possa avaliar sua participação não apenas como "agente passivo" do risco, mas participante ativo das suas decisões. Este não é um mero tema da política de remuneração das empresas que em geral é cuidado pela área de recursos humanos. É um assunto que envolve os controladores e sua disposição para compartilhar decisões.

Uma pesquisa da PriceWaterhouse Coopers com 100 empresas de diversos tamanhos no Brasil (60% delas com mais de mil funcionários) e de diversos setores, concluiu que apenas 20% oferecem esse "benefício" aos seus presidentes e diretores e 10% estudam implantá-lo.

Este resultado mostra que o universo de oportunidades é amplo mas também exige alterar o distorcido conceito que participação acionária é um "benefício", ou seja, um item apenas da política de remuneração.

Tornar pessoas sócias de um empreendimento exige muito mais preparo do que simplesmente continuar utilizando o velho conceito da cenoura motivadora. E o Brasil está mudando na busca de formas e caminhos próprios, mesmo quando algumas destas práticas são copiadas de outras culturas. Vale um esforço no sentido de adequá-las à nossa realidade.

Renato Bernhoeft, Valor Econômico - SP
21/07/2008
VOLTAR IMPRIMIR