22 de Julho de 2008 - 18h:07

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Os futos da lei das falências

A nova legislação, que completa seis meses, é um avanço, mas a experiência de Varig e Parmalat mostra que há ajustes a serem feitos

Por: ISTOÉ DINHEIRO

Leia essas duas frases. Uma: “A lei salvou minha companhia. Sem ela, teríamos quebrado.” Duas: “Passamos por momentos de terror em função da lei.” As duas declarações partem de pessoas diferentes que trabalham em empresas diferentes, chegam a conclusões diferentes, mas tratam do mesmo assunto: a Lei de Recuperação de Empresas, ou, como é chamada, a nova Lei de Falências. A primeira frase saiu da boca de Nelson Bastos, presidente da Parmalat. A segunda foi enunciada por Ricardo Bullara, diretor de controladoria e relações com investidores da Varig. São as duas maiores empresas a aderir à nova legislação. Suas experiências revelam que a lei abriu um caminho inédito para a recuperação de companhias sufocadas por dívidas, mas serão necessários diversos ajustes para se tornar mais eficaz. “Há muito estigma em torno do assunto”, afirma o advogado Flávio Pereira Lima, do escritório Mattos Filho. “Acredita-se que uma empresa em dificuldades financeiras está condenada à morte. É uma herança do período em que a concordata era a única saída para essa situação – uma saída que não funcionava. São conceitos arraigados que devem ser enfrentados.”

As empresas se deparam também com o desconhecimento de uma lei recém-nascida, carente de jurisprudência. Por isso, a Justiça do Estado criou varas especializadas no assunto. Os juízes já tomaram algumas decisões importantes para minimizar os efeitos de alguns furos da legislação. Por exemplo: o plano de recuperação só pode ser homologado nos tribunais se a empresa estiver quites com o Fisco. “A exigência é estranha, pois se uma companhia não consegue honrar seus compromissos, é provável que ela também não esteja pagando tributos”, lembra Rogério Lessa, presidente da Demarest & Almeida, uma das maiores bancas de direito empresarial do País. Por isso, os juízes não têm exigido as certidões negativas de impostos. “Eles entendem que esse item fere o próprio espírito da lei, que é criar condições de recuperação para a empresa”, afirma Lessa.

Para a Varig, uma das primeiras empresas a recorrer à lei, a decisão custou muito dinheiro. “Pagamos pelo pioneirismo”, afirma Bullara. Assim que a companhia aérea anunciou sua decisão, bancos passaram a recusar o desconto de recebíveis, como faturas de cartão de crédito. Prestadoras de serviço e fornecedores europeus passaram a exigir pagamento antecipado. Instituições financeiras nos EUA que emprestavam dinheiro para fluxo de caixa, o chamado hot money, também fecharam as torneiras. Isso custou cerca de US$ 50 milhões à Varig. “Faltou experiência para nós”, diz Bullara. “Nos EUA, antes de aderirem ao Chapter Eleven, as empresas fazem caixa durante meses para enfrentar esse período.” Bullara também descobriu que o prazo para elaborar e aprovar do plano de recuperação, estipulado pela lei em seis meses, é exíguo. “É pouco tempo para reunir toda a documentação necessária de uma empresa do porte da Varig, por exemplo”, diz Lessa, da Demarest. Bullara e sua equipe trabalharam todos os finais de semana de janeiro com esse objetivo. “A pressão foi tão grande que dez dos executivos da área de controladoria saíram da empresa”, conta ele.

O saldo, porém, é positivo, segundo empresários e advogados ouvidos pela DINHEIRO. Bastos, da Parmalat, enfrentou uma assembléia de credores divididas em três sessões, a última delas com dez horas de duração. No final, seu plano de recuperação da Parmalat estava aprovado com mais de 95% dos votos. “Se fosse pela antiga legislação, bastava um credor não aceitá-lo e a empresa iria para a falência”, compara ele. “A lei pode precisar de ajustes, mas é um enorme passo à frente no apoio a empresas em dificuldades.”

Por Joaquim Castanheira

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