26 de Maio de 2008 - 19h:48

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Grandes empresas ficam cada vez maiores

Por: Folha de São Paulo

A tropa da elite empresarial brasileira ganhou mais poder e uma nova cara nos últimos dez anos. Saíram de cena estatais e ganharam porte produtores de commodities (produtos primários como ferro e aço). Algumas áreas se consolidaram com fusões e aquisições e outras empresas simplesmente desapareceram do mapa da Bovespa (Bolsa de Valores de São Paulo), como mostra levantamento da consultoria Economática.

A participação das 32 maiores empresas brasileiras de capital aberto em relação ao PIB (Produto Interno Bruto) saltou de 11,7% para 30%, entre 1998 e 2007. Se forem consideradas apenas as dez maiores, o aumento da concentração em relação ao PIB foi ainda maior: os percentuais passam de 6,3% para 20% no período.

Os valores foram calculados pela FGV (Fundação Getulio Vargas), com base no faturamento anual das empresas listadas na Bovespa em dólares atualizados comparado com o PIB nacional, dolarizado e também atualizado.

"Essa concentração é natural num mercado novo, no qual a maioria das empresas são familiares e nascidas após a Segunda Guerra", diz William Eid Júnior, coordenador do Centro de Estudos em Finanças da FGV. "Com o passar do tempo, os setores tendem a se consolidar para ganhar escala."

Economia madura

Segundo Eid, mudanças desse porte levam tempo em países de economia madura. No Brasil, no entanto, elas não só aconteceram fortemente num curto intervalo de tempo como tendem a continuar. Os motivos são variados.

"Para entender os últimos dez anos, é necessário entender os dez anos anteriores", afirma José Carlos Grubisich, presidente da Braskem. A empresa petroquímica é uma das que não existiam em 1998. Foi criada há cinco anos, mas tem funcionários que comemoram 25 anos de empresa. Isso porque ela atua numa área que passou por um processo de consolidação e, que em 2007, ocupava a sétima posição no ranking de faturamento anual em dólares.

Neste ano, tende a galgar alguns postos, bem como o Grupo Ultra. As duas companhias e a Petrobras incorporaram ativos da Ipiranga no ano passado.

Grubisich elenca os fatos da década de 1990 que prepararam as mudanças mais recentes: abertura de mercado, privatizações, controle da inflação, Lei de Responsabilidade Fiscal, reformas estruturais e autonomia do Banco Central. Tudo isso, logo após a promulgação da Constituição de 1988 e da consolidação da democracia.

"É um conjunto de coisas que mudou o Brasil", diz Grubisich. "Não somos o mesmo país nem as mesmas empresas de alguns anos atrás."

Menos estatais

Em dezembro de 1998, das 10 maiores empresas por valor de mercado listadas na Bovespa, 5 eram estatais e 4 eram bancos, sendo que dois deles públicos. No dia 16, só restava a Petrobras como estatal entre as maiores companhias por valor de mercado.

Ainda estão lá quatro bancos, mas só o BB é ligado ao Estado. As restantes são empresas privadas: Vale, AmBev, CSN, Gerdau e Usiminas.

Essa está longe de ser a única alteração dos últimos anos. "O perfil dos trabalhadores mudou com as empresas", afirma Roberto Castello Branco, diretor de Relações com Investidores da Vale.

"Os funcionários da Vale estatal tinham mais idade, qualificação menor e a percepção de que o emprego era para toda a vida. Os estímulos mudaram e, hoje, empregamos mais gente e os salários são maiores exatamente porque as pessoas são mais bem preparadas."

Saúde financeira

Outro exemplo de mudança diz respeito à saúde financeira das empresas. Ao ser criada, em agosto de 2002, a Braskem, por exemplo, precisava de sete anos e meio de geração de caixa para pagar seu endividamento. As dívidas eram 70% em dólares e 80% venciam em um ano.

Segundo Grubisich, o prazo médio de vencimento da dívida hoje é de 12 anos e a relação dívida líquida/geração de caixa caiu para 1,7 ano e, depois da compra da Ipiranga e da Politeno, está em 2,5 anos.

"A estabilização permitiu que as empresas se dedicassem à parte ofensiva da estratégia e gastassem menos tempo com a parte defensiva, da proteção do patrimônio", diz o executivo.

Apesar de que já era a maior empresa brasileira em 1998 e continuar muito acima das outras em termos de receita, a Petrobras também se tornou mais ofensiva de dez anos para cá, graças à abertura de mercado. "A mudança no regime de concessão fez com que a Petrobras ganhasse concorrentes e buscasse competir com eles", diz Almir Barbassa, diretor financeiro da Petrobras.

Além disso, a estatal elevou o volume de ações disponíveis no mercado e foi listada na Bolsa de Nova York. Segundo Barbassa, a partir daí a divulgação das ações da empresa tornou-se mais freqüente e abrangente.

Revolução silenciosa

"Houve uma revolução silenciosa no Brasil nos últimos dez anos que foi a evolução do mercado de capitais", afirma Grubisich.

"O acesso a capital que não é dívida e a profissionalização e a governança aplicada a empresas familiares prepararam as companhias brasileiras para a inserção no processo global."

Foi exatamente essa a trajetória do Grupo Ultra, que ocupa a sexta posição entre as maiores empresas de capital aberto. Criada há 71 anos pela família Igel, profissionalizou-se e abriu o capital em 1999. "Sabe aquele ditado que o olho do dono é que engorda o boi?", brinca André Covre, diretor financeiro do Ultra. "Pois temos 9.000 investidores cobrando a engorda."

Segundo ele, a pressão do mercado trouxe vários benefícios, que vão desde a simplificação da estrutura acionária até a disciplina com relação à alocação de recursos, à transparência e à busca por eficiência.

"Atrelar a remuneração variável dos executivos ao desempenho da empresa, por exemplo, não era prática comum dez anos atrás", diz Covre. "Hoje é uma realidade, como muitos outros avanços em relação à transparência e à governança."

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