16 de Maio de 2008 - 14h:50

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Ministro defende punição para responsáveis por tortura na ditadura

Por: Folha Online

O ministro da Justiça, Tarso Genro, defendeu ontem o julgamento e a punição dos responsáveis pelos crimes de tortura durante o regime militar (1964-85). Em sua opinião, a Lei da Anistia, de 1979, não protege os torturadores.

O ministro afirmou também que o "sigilo eterno" de documentos secretos oficiais "não serve ao Estado democrático de Direito". A medida restritiva ao acesso público à informação, criada no governo tucano de Fernando Henrique Cardoso, em 2002, foi mantida pela administração petista de Luiz Inácio Lula da Silva.

Ela permite que documentos, inclusive os do regime militar, permaneçam para sempre inacessíveis aos cidadãos.
As declarações de Tarso se opõem à posição das Forças Armadas e de muitos setores do governo. Ano passado, o ministro da Defesa, Nelson Jobim, disse que a Lei da Anistia trouxe "conciliação e pacificação".

O Ministério da Defesa informou que Jobim está em viagem no exterior e que ninguém poderia falar pela pasta.
A interpretação política hegemônica, porém controversa, sustenta que a anistia beneficiou os dois lados: funcionários do regime e oposicionistas.

Passado apagado

O presidente do Clube Militar, general da reserva Gilberto Figueiredo, respondeu a Tarso: "Se for pensar assim, tem gente que ocupa cargos de ministro que fez a mesma coisa: torturou, só que pelo outro lado. Roubou, assaltou banco".
Mais: "A Lei da Anistia foi para apagar esse passado. No Brasil, esses casos [de tortura] foram poucos e localizados. Acho que Tarso Genro está querendo tumultuar um pouco, como está tumultuando lá no problema da [reserva indígena em Roraima] Raposa/Serra do Sol".
Tarso discursou no terreno onde funcionou a sede da UNE (União Nacional dos Estudantes) até 1964, na praia do Flamengo, zona sul do Rio.

"Torturadores e genocidas desse país (...) nem sequer foram julgados pelos crimes que cometeram nos porões da ditadura. (...) Teve pessoas de boa-fé defendendo o regime", disse.
"Elas dizem: "A anistia foi feita para todos, inclusive os torturadores". Eu respondo: se ela foi feita para os torturadores, eles têm que ser julgados, que receber uma pena e depois receber anistia."
Em entrevista, Tarso afirmou: "Para tratar dessa questão [punição criminal], não precisaria de mudança na lei. A Lei da Anistia é uma lei política. Ela incide sobre crimes políticos. A tortura não pode ser considerada um crime político".
"Se um agente público invade uma residência na época da ditadura, cumprindo ordem ilegal do administrador autoritário de plantão, e prende pessoas, isso é um crime político originário do Estado de fato vigente naquele momento."

"Se esse mesmo agente público prende essa pessoa e a leva para um porão e a tortura, este crime de tortura não é um crime político, porque nem a legalidade da ditadura permitia o crime de tortura. Portanto, crimes como esse não poderiam estar abrigados [pela Lei da Anistia]. Agora, isso tem que ser uma interpretação do Poder Judiciário. Não é necessário modificar a lei para que esses crimes sejam punidos."
O ministro assinou ontem portaria criando o Memorial da Anistia Política no Brasil. Ele disse ser ainda hoje "militante socialista e revolucionário".

Criticou a cobertura jornalística sobre o trabalho da Comissão de Anistia, que já aprovou reparações no montante -de acordo com seu presidente- de R$ 2,4 bilhões: "Em cima de determinados temas, [existe] uma velada censura a respeito do trânsito de opiniões".
Em dezembro, o ministro dos Direitos Humanos, Paulo Vanucchi, disse considerar imprescritível o crime de tortura. Porém, não fez a defesa aberta da punição como Tarso.
No evento de ontem, o presidente da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Cezar Britto, disse que "a posição histórica da entidade é que a anistia não abrangeria os crimes de sangue cometidos pelo Estado". "Embora [a opinião] tenha sido vencida em vários questionamentos judiciais", disse.
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