18 de Março de 2008 - 14h:50

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Cresce arbitragem na área trabalhista

entendimento do Poder Judiciário sobre a validade da arbitragem trabalhista ainda é divergente

Por: Valor On Line

Solucionar conflitos trabalhistas por meio de câmaras de arbitragem é uma prática que cresce no país. Mas, acompanhando este movimento, aumenta também o número de instituições consideradas inidôneas, que realizam procedimentos que não são compatíveis com o método de solução extrajudicial de conflitos e terminam por restringir direitos dos trabalhadores. O principal foco desta atuação ilegal é o Rio de Janeiro, onde o Ministério Público do Trabalho (MPT) já ajuizou cinco ações civis públicas contra câmaras de arbitragem que considera "picaretas". O entendimento do Poder Judiciário sobre a validade da arbitragem trabalhista ainda é divergente - no Tribunal Superior do Trabalho (TST) há apenas um julgamento a respeito, no sentido de que a arbitragem trabalhista deve ser utilizada apenas para a solução de conflitos, sem especificar se o método é válido tanto para os litígios individuais quanto para os coletivos.

A possibilidade de resolver conflitos trabalhistas em câmaras de arbitragem ganhou força com a Lei de Arbitragem - a Lei nº 9.307, de 1996. Como se tratam de procedimentos sigilosos, não é possível ter acesso ao número total de procedimentos já realizados no país, mas sabe-se que as três principais instituições de arbitragem trabalhista no Estado de São Paulo - o Tribunal de Arbitragem do Estado de São Paulo (Taesp), o Conselho Arbitral do Estado de São Paulo (Caesp) e a Câmara de Alçada Arbitral Brasileira (Taab) - já realizaram cerca de 60 mil procedimentos desde 1998. De acordo com dados do Conselho Nacional das Instituições de Mediação e Arbitragem (Conima), o uso da arbitragem cresce cerca de 5% ao ano em todas as áreas que abrange, e há hoje mais de 200 câmaras especializadas em arbitragem trabalhista.
A disseminação da arbitragem no âmbito das relações do trabalho acabou por provocar o uso do método também em situações não conflituosas, como na homologação de rescisões de contratos de trabalho - prática somente autorizada às delegacias do trabalho e às câmaras de conciliação prévia dos sindicatos. O fato chamou a atenção do Ministério Público do Trabalho, que passou a coibir a prática por entendê-la prejudicial aos trabalhadores. No Rio, o orgão ajuizou cinco ações civis públicas contra câmaras que atuam desta forma e há dezenas de investigações em curso em todo o Estado.
No município carioca de Nova Iguaçu, por exemplo, há sete procedimentos investigatórios em andamento. As câmaras investigadas normalmente utilizam nomes "pomposos" e homologam acordos que tratam do pagamento de verbas rescisórias sem que haja qualquer litígio entre as partes. Uma das câmaras investigadas pelo Ministério Público do Trabalho, por exemplo, funcionava no quintal da casa de um "árbitro". Segundo o procurador do trabalho Carlos Augusto Sampaio Solar, do ofício de Nova Iguaçu, foram estabelecidos termos de ajustamento de conduta (TACs) com quatro câmaras de arbitragem para que não procedessem homologações e nem proferissem sentenças em matérias que tratam de direitos individuais de trabalhadores.
Enquanto o Ministério Público do Trabalho entende que a arbitragem trabalhista só deve ser utilizada em casos de dissídios coletivos, as câmaras de arbitragem trabalhista atuam de forma diferente. Para Cássio Telles Ferreira Netto, presidente do Caesp e do Conima, o método pode ser utilizado também em conflitos individuais do trabalho. "Por ser bem mais rápida do que a Justiça trabalhista, a arbitragem restabeleceu a justiça nos grandes centros" diz. Para Ana Lúcia Pereira, diretora do Taesp, nas câmaras os conflitos são resolvidos, em média, em quatro meses, e na maioria dos casos até a segunda audiência. "O método é economicamente vantajoso para ambas as partes devido aos custos de uma ação judicial", diz Ana. Já para Elibezath Ribeiro Alcântara, coordenadora da Câmara Brasileira de Mediação e Arbitragem Empresarial (CBMAE), os conflitos individuais podem ser resolvidos por meio da arbitragem trabalhista apenas quando envolverem funcionários de altos cargos, como executivos de empresas, em questões mais complexas.
No Judiciário, não há um entendimento pacificado sobre a validade do uso da arbitragem em questões trabalhistas e alguns juízes confirmam o entendimento do Ministério Público do Trabalho de que o método não pode ser aplicado aos conflitos individuais. Isto porque a Lei da Arbitragem determina que o instituto só pode ser usado para dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis, o que excluiria os direitos do trabalho. Ao que se sabe, há apenas um acórdão a respeito no Tribunal Superior do trabalho (TST), de 2005. No caso, a quarta turma da corte não reconheceu a prática porque não se tratava de um conflito trabalhista, e sim de uma homologação de um contrato de rescisão. Para o juiz Cláudio José Montesso, presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), a legislação já prevê uma solução extrajudicial nas comissões de conciliação prévia dos sindicatos e não é possível utilizar a arbitragem trabalhista nem mesmo em dissídios coletivos. "O método implica na renúncia dos direitos do trabalhador", diz.
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