04 de Março de 2008 - 15h:13

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Cessionários da União discutem aumentos

Em ações judiciais ou processos administrativos são questionados os aumentos que chegaram a quase 10.000%.

Por: Valor On Line

Os proprietários e ocupantes de imóveis em "terrenos de marinha" - áreas cedidas pela União na costa e às margens de rios e lagos - começam a contestar os aumentos efetuados pelo governo federal, no ano passado, em relação aos valores devidos pelo uso das terras. Em ações judiciais ou processos administrativos são questionados os aumentos que chegaram a quase 10.000%.

 

É o caso de um terreno em Angra dos Reis, no Rio de Janeiro, cedido pela União para "ocupação" - espécie de contrato de aluguel. O cessionário, que recolhia até 2006 uma taxa anual de ocupação de R$ 3,6 mil, foi surpreendido no ano passado com uma cobrança no total de R$ 345 mil, ou 9.583,33% maior. Para o advogado José Nicodemos Cavalcanti de Oliveira, do José Nicodemos & Advogados Associados, que contesta a cobrança administrativamente, o aumento fere a lei que regulamenta o processo administrativo federal - a Lei nº 9.784, de 1999. Segundo ele, o ocupante não foi notificado do aumento antes de receber a cobrança.

A Secretaria de Patrimônio da União (SPU), que arrecada os valores, afirma que os aumentos ocorreram por dois motivos. De acordo com a secretária de Patrimônio, Alexandra Reschke, a legislação que disciplina a cessão das terras prevê a atualização anual do valor das propriedades, que não era feita há pelo menos sete anos. "O valor das atualizações não realizadas foi cobrado em 2007", afirma. Para chegar aos novos valores, no entanto, a secretaria realizou um trabalho nacional de remapeamento das áreas, o que levou dois anos. Os primeiros resultados saíram no ano passado e também elevaram o valor das cobranças, devido às novas avaliações dos imóveis.

No entanto, para o advogado Leonardo Rzezinski, do escritório Rzezinski, Bichara, Balbino e Motta Advogados, os aumentos são ilegais por usarem o valor de mercado dos imóveis como base, incluindo benfeitorias. "A norma da SPU que permitiu os aumentos contraria a legislação sobre o assunto", afirma. De acordo com ele, o Decreto-Lei nº 3.438, de 1941, uma das normas que rege as cobranças, obriga a SPU a deduzir da base de cálculo o valor das benfeitorias nos imóveis, mas a Orientação Normativa nº 4, de 2003, foi editada pela secretaria permitindo a cobrança sobre os valores de mercado.

O advogado impetrou recursos administrativos em favor de uma incorporadora, contestando diferenças de mais de R$ 10 milhões em cobranças de "foro" - valor anual devido por proprietários de áreas úteis dentro de terrenos da União - e "laudêmio" - comissão devida ao governo federal a cada transferência dos imóveis.

Em janeiro, o Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região concedeu uma liminar em favor de um ocupante que recebeu a taxa de 2007 majorada em 1.182,74% em relação ao ano anterior. Segundo o advogado que defende o ocupante, Fábio Guero, do Guero e Coelho Advogados, o valor cobrado até 2006 pelo imóvel no município de Penha, em Santa Catarina, era de R$ 598,27. Em 2007, a cobrança foi para R$ 7.075,98. A liminar do TRF, contudo, limitou a cobrança aos valores de 2006. "O entendimento da Justiça foi de que a União estaria tendo um enriquecimento indevido com a incidência sobre o valor de mercado", afirma o advogado.

A Advocacia Geral da União (AGU), porém, considera os aumentos feitos pela SPU dentro da legalidade. Segundo a advogada da União, Tânia Vaz, os Decretos-Lei nº 2.398, de 1987 e nº 9.760, de 1946, permitem ao governo a cobrança do "foro" e da taxa de ocupação utilizando o domínio pleno dos terrenos como base de cálculo, o que, segundo ela, corresponderia ao valor de mercado. "O terreno é da União e a necessidade do Estado se impõe sobre a do particular", afirma o advogado.
Apesar dos questionamentos, a Secretaria de Patrimônio comemora o ano de 2007 como um dos exercícios com menor índice de inadimplência. Segundo a secretária Alexandra Reschke, novos reajustes devem ocorrer. Ainda em 2008 serão reavaliados mais de 32 mil imóveis nos Estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Pernambuco. De acordo com a secretaria, há 1,45 milhão de imóveis em terrenos da União, dos quais apenas 550 mil estão cadastrados.
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